Nos últimos meses, os bebês reborn, bonecas hiper-realistas que imitam recém-nascidos, deixaram de ser apenas itens de coleção. A princípio vistos nas redes sociais, em pouco tempo conquistaram espaço na mídia e, surpreendentemente, passaram a surgir também em ambientes corporativos.
O que parece excentricidade é, na verdade, um sinal de alerta sobre saúde mental no trabalho.
Atualmente, a recente atualização da NR-01, que obriga empresas a incluírem riscos psicossociais no seu Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), evidencia uma verdade incômoda: o sofrimento emocional dos colaboradores precisa ser reconhecido e cuidado de forma ativa.
Neste artigo, vamos explorar como o comportamento aparentemente inofensivo de levar um bebê reborn ao trabalho pode, por consequência, revelar dores profundas — e como o RH, a liderança e a empresa podem agir com estratégia, empatia e prevenção.
Índice
Toggle1. Estresse no trabalho e os novos Refúgios Emocionais
A Organização Mundial da Saúde (OMS) já classificou o burnout como um fenômeno ocupacional. Com efeito, no Brasil, essa questão tem se tornado cada vez mais alarmante: mais de 70% dos profissionais brasileiros relatam sintomas de estresse relacionados ao trabalho, segundo estudo publicado pela International Stress Management Association (ISMA-BR).
Os principais gatilhos incluem:
- Carga horária excessiva e metas inalcançáveis;
- Falta de reconhecimento;
- Liderança autoritária ou ausente;
- Conflito entre vida pessoal e profissional.
A fim de aliviar o sofrimento, muitos colaboradores recorrem a mecanismos de coping emocional, que vão desde práticas saudáveis, como a meditação, até formas simbólicas, como o apego a objetos afetivos. Assim sendo, é nesse ponto que entram os reborns.
🎙 Dra. Nicolli Callegari, psicóloga:
“Em contextos de estresse elevado, algumas pessoas recorrem a objetos simbólicos como forma de autorregulação emocional. O uso de bebês reborn pode representar um gesto subjetivo de busca por conforto e segurança emocional, especialmente quando há ausência de vínculos de escuta no ambiente.”
2. Bebês reborn no trabalho: um alerta vermelho
Embora o uso dos bebês reborns possa parecer apenas um passatempo, em alguns casos, o uso excessivo ou disfuncional pode ser sintoma de um problema emocional mais profundo.
Sinais de atenção:
- É o único mecanismo de relaxamento;
- Interfere na produtividade ou frequência no trabalho;
- Há uma humanização excessiva da boneca (crises emocionais, disputas “de guarda”, etc.).
🎙 Dra. Nicolli Callegari:
“Quando um comportamento simbólico se torna a única forma de enfrentamento possível, isso pode indicar níveis significativos de sofrimento psíquico. Nesses casos, é importante oferecer escuta profissional qualificada, para compreender o que esse gesto comunica e o que pode estar sendo silenciado.”
3. A nova NR-01 e os Riscos Psicossociais no trabalho
Em 2025, a NR-01 foi atualizada e passou a exigir o mapeamento de riscos psicossociais no ambiente corporativo. Dessa forma, a norma passa a incluir fatores como:
- Estresse crônico e burnout;
- Conflitos interpessoais;
- Assédio moral;
- Sensação de não pertencimento.
Atualmente, esses elementos são reconhecidos como ameaças reais à saúde e à produtividade, e devem ser monitorados e gerenciados pelas empresas.
🎙 Dra. Nicolli Callegari:
“A NR-01 é uma oportunidade para transformar a cultura organizacional. Não basta campanha pontual — é preciso criar políticas contínuas de cuidado emocional.”
4. O que a empresa pode fazer? Ações práticas de prevenção e acolhimento
a) Construir uma Cultura de Acolhimento
- Promover rodas de conversa sobre saúde mental;
- Treinar líderes para escuta ativa e empática;
- Combater o estigma da vulnerabilidade.
b) Oferecer recursos reais de bem-estar
- Parcerias com psicólogos e plataformas de apoio emocional;
- Espaços de descompressão e atividades como mindfulness;
- Incentivo a hobbies e pausas regenerativas.
🎙 Dra. Nicolli Callegari:
“Se a pessoa busca refúgio em bonecos porque não tem energia para mais nada, o problema não é o hobby — é a exaustão crônica.”
c) Ler o sinal por trás do comportamento
Evite julgamentos ou repressões, pois um comportamento simbólico pode ser o grito silencioso de quem não se sente ouvido.
🎙 Dra. Nicolli Callegari:
“Reprimir comportamentos simbólicos pode silenciar sinais importantes de sofrimento emocional. Quando a empresa oferece espaços de acolhimento e escuta, contribui para a saúde psíquica de seus colaboradores e para um ambiente mais humano e sustentável.”
Conclusão: Cuidar é estratégia, não fragilidade
O fenômeno dos bebês reborn evidencia a crise emocional nas empresas. Portanto, não se trata da boneca, mas da ausência de vínculos, da falta de escuta e também da sobrecarga silenciosa.
Desse modo, com a NR-01 em vigor, o cuidado com a saúde mental deixou de ser opcional: é exigência legal, estratégia de gestão e compromisso humano.
A pergunta que líderes precisam se fazer não é “por que alguém leva um reborn ao trabalho?”, mas sim: “por que essa pessoa sente que só a boneca a escuta?”.
Empresas que, antes do colapso, cuidam da saúde mental dos colaboradores, estão, portanto, mais preparadas para os novos tempos e para as pessoas que os habitam.